Nada


Tu podias ficar com tudo
Que um dia foi como nosso
Nossa surpresa com o encontro
O meio do caminho e o frio do caminho de volta
E o estranhamento
Com as lembranças de um tempo antigo
Ficasses  com todos os poemas, as frases, os efês, os vês, os agás e as vírgulas mal colocadas
 e as fotos
as inteiras e as cortadas
e com a perdida
Podia ficar com o lago, esse nunca foi meu de verdade
Podia ficar com o Don Quixote preso na cristaleira
E com o brinco de sininho, já estava contigo mesmo
Podia ficar com os telefonemas noturnos
E com aquele quase e velado eu ti amo sussurrado
Com todos os planos de encontros
Com os beijos na chegada
com a cerveja autografada e prometida
Com as pétalas jogadas, com os cactus ressequidos
Com as músicas de outrora
Com todas as lágrimas grossas e salgadas derramadas no escuro
Dos cinemas, dos cafés, dos sebos
Com o tempo, a ampulheta, a areia e o passado
Com os dias, os anos e os 15 segundos
E com aquela mensagem primeira, fumando um charuto.
Podia ficar com minha letra numa capa de vinil e com tua assinatura numa bolsa dos anos que não voltam
Podia fica com os morros
a lua
e o mel todo.

Devia não ter digitado a sentença derradeira
E ficado
Com o desencanto, com a certeza, com o sortilégio.

Podia ficar com tudo que eu não queria levar nada.

Diante da vida estávamos separados
dentro de mim estávamos juntos
e
isso era tudo o que me bastava.